Hoje (24), serão comemorados os 83 anos de conquista do voto feminino no Brasil. A data traz em sua história uma série de lutas envidadas por mulheres e homens para garantir esse direito às mulheres, desde o século XVIII, quando na Revolução Francesa o Marques de Condorcet, em atitude considerada surreal para a época, ocupou a Assembleia Nacional, no ano de 1790, e criticou os políticos que impediam as mulheres de participarem do voto universal.
Esse passo pioneiro foi suficiente para que se alastrasse por toda a Europa a bandeira do voto universal feminino. Na Inglaterra, a luta tomou ares de movimento sufragista depois da publicação de textos de John Stuart Mill. O grande economista inglês escreveu o livro The Subjection of Women (1869) no qual revelava que a subjugação legal das mulheres é uma discriminação, devendo ser substituída pela igualdade total de direitos. A partir daí a campanha pelo voto feminino ultrapassou os limites territoriais europeus, e em pouco mais de duas décadas (1893), a Nova Zelândia se tornou o primeiro país a garantir o sufrágio feminino.
No Brasil, o movimento tomou corpo através da ativista e bióloga Bertha Maria Julia Lutz (1894-1976). Em viagens pela Europa, onde estudou, e Estados Unidos ela acompanhou a luta dos movimentos feministas. Mulher corajosa e determinada, ela criou e participou de movimentos como a Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher e foi representante do Brasil na Liga das Mulheres Eleitoras. Com o advento da Revolução de 1930 e dez anos depois da criação por Bertha Lutz da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, instituída por Berta Lutz, o movimento sufragista conseguiu a grande vitória em 1932.
O voto feminino foi garantido através do Decreto nº 21.076, de 24/02/1932, assinado pelo, então, presidente Getúlio Vargas, no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro.
Pioneirismo no Rio Grande do Norte
Em 1926, quando a Constituição brasileira foi revisada, os legisladores não incluíram uma disposição consagrando, explicitamente, a igualdade de direitos para ambos os sexos. Tal falha gerou protestos do então senador Juvenal Lamartine, um candidato ao Governo que defendia a inclusão dos direitos e deveres cívicos para homens e mulheres. Neste sentido, foi feita a seguinte emenda no Artigo 77, das Disposições Gerais:
No Rio Grande do Norte, poderão votar e ser votados, sem distinção de sexo, todos os cidadãos que reunirem as condições exigidas por esta lei.
No dia 25 de outubro de 1927, passou a vigorar a Lei Estadual nº 660, com a emenda Regular o Serviço Eleitoral do Estado, que estabelecia a não distinção de sexo para o exercício do sufrágio e, tampouco, como condição básica de elegibilidade. Assim, em 25 de novembro de 1927, Celina Guimarães Viana deu entrada em uma petição, mediante a qual requeria sua inclusão na lista de eleitores. Ao receber do juiz um parecer rápido e favorável, fez um apelo ao presidente do Senado Federal para que todas as mulheres tivessem o mesmo direito. Em seu telegrama, lia-se:
Peço nome mulher brasileira seja aprovado projeto institui voto feminino amparando seus direitos políticos reconhecidos Constituição Federal – Saudações Celina Guimarães Viana – Professora Escola Normal Mossoró.
Pioneiras
É importante lembrar que Celina Guimarães Viana, natural de Mossoró, não foi a primeira mulher a requerer inclusão no alistamento eleitoral. Em verdade, tal pioneirismo coube à professora Júlia Alves Barbosa, nascida em Natal, em 24 de novembro de 1927. Entretanto, na época, dada à sua condição de solteira, o juiz da 1ª vara da Capital retardou o deferimento do pleito de Júlia, e este só saiu publicado, no Diário Oficial do Estado, no dia 1º de dezembro do mesmo ano. Por outro lado, o despacho de Celina foi rapidamente aprovado, pelo fato de ser casada com um advogado e professor. Logo, por ser esposa de alguém importante, Celina se tornou a primeira eleitora não apenas do Rio Grande do Norte e do Brasil, porém, de toda a América Latina. E Júlia Alves Barbosa ficou sendo a segunda eleitora. Seja como for, pode-se observar como o movimento sufragista potiguar era atuante, na época.
Com a promulgação da Lei Estadual n. 660, explicitando os direitos políticos e civis das mulheres e, em particular, o direito ao voto, Celina passou a conscientizar as mulheres acerca da importância de se votar; e, somente na década seguinte, aquela Lei foi ampliada para os demais Estados da Federação. Em pouco tempo, a notícia corria o mundo, sendo aclamada em vários jornais feministas. Para poder votar, é importante frisar, as mulheres precisavam ter mais de 21 anos, não ser analfabetas, ter uma profissão que garantisse renda, não viver de mendicância, e tampouco ser religiosas com voto de obediência.
Júlia Alves Barbosa Cavalcanti nasceu em 1898, em Natal/RN. Era uma líder nata, educadora e catedrática da Escola Normal de Natal, pioneira em movimentos pela emancipação da mulher, e engajada em lutas contra os preconceitos. Diplomada professora, ela foi a primeira mulher a ensinar matemática na Escola Normal do Estado, tendo entrado por meio de concurso.
Júlia poderia ter sido a primeira eleitora do Brasil, pois requereu seu alistamento eleitoral no dia 22 de novembro de 1927, pouco menos de um mês depois de sancionada a Lei Estadual de nº 660, que consolidou a vitória dos direitos políticos da mulher norte-rio-grandense. Porém, a taça do pioneirismo ficou com Celina Guimarães Viana, nascida na cidade de Mossoró/RN, que, na época, por ser casada e contar com o apoio do marido - um advogado e professor - teve seu requerimento despachado com rapidez e publicado no Diário Oficial do Estado, antes que o de Júlia.
Cabe registrar que, em seus 45 anos de vida, Júlia Alves Barbosa Cavalcanti quebrou barreiras e enfrentou preconceitos, tendo sido uma das fundadoras da Associação de Eleitoras Norte-rio-grandenses, entidade que teve um papel pioneiro no Estado, no tocante à conscientização da mulher como cidadã.
A importância de Júlia Alves Barbosa Cavalcanti se traduz no seu pioneirismo de ter sido a primeira vereadora a ter assento na Câmara Municipal de Natal no mandato que se iniciou em 1928, sendo a primeira mulher vereadora da América Latina.Pioneirismo reconhecido e divulgado na Cartilha: Presença Feminina na Câmara Municipal de Natal – 2012.
Júlia foi casada com o professor e poeta Francisco Ivo Cavalcanti. Ela faleceu em Natal, em 1943.
Pesquisa: Udymar Pessoa
Fonte:
VAINSENCHER, Semira Adler. Júlia Alves Barbosa. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: . Acesso em: 24 de fevereiro de 2014.
CARDOSO, Udymar Pessoa Dantas,Câmara Municipal de Natal: 400 anos de trabalho, 400 anos de História – 2012.
De lá pra cá muitas foram os avanços que permitiram a mulher maior liberdade para lutar por causas sociais, e com isso conquistar mais espaço no cenário político nacional, proporcionando que hoje existam mulheres em praticamente todos os cargos eletivos. Números publicados pelo Instituto Patrícia Galvão em 2012 revelam que na Câmara dos Deputados, existem 44 deputadas. No Senado Federal, dos 81 cargos eletivos 13 são ocupados por mulheres; nas prefeituras as mulheres são menos de 10% das prefeitas e, nas Câmaras de Vereadores, as políticas são menos de 12% dos vereadores.
Cabe a nós, mulheres do século XXI, então, mudarmos esses números e percentuais no poder público, mas com a condição de uma representação que venha junto aos anseios de todas e modifique, com nosso apoio, a realidade que ainda subjuga as mulheres - com salários ainda inferiores aos dos homens e a violência em todas as suas formas -, e priorize políticas públicas de saúde, educação e moradia.
Enfim, cabe a cada uma de nós, refletir e lutar unidas para mudar nossa realidade.
Pesquisa: Udymar Pessoa
Fontes:
VAINSENCHER, Semira Adler. Júlia Alves Barbosa. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: . Acesso em: 24 de fevereiro de 2014.
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