24 de outubro de 2009

A grande imprensa e o profissionalismo. Profissionalismo?

A pauta para investigar a grande imprensa hoje pode ser a seguinte: até onde os coleguinhas - fala-se daqueles mais velhos - acreditam no que escrevem? E por que mesmo que a todo o momento exigem a chancela patronal para exporem seus pontos de vista? Onde é mesmo que a palavra "profissionalismo" entra nesta história?

Enio Squeff

Das críticas que se faz à grande imprensa, há sempre uma constante: a mídia teria abdicado de toda e qualquer imparcialidade, para cumprir o mandamento patronal de jamais conceder ao governo; ou à imagem que ela própria construiu do governo. Fala-se pouco ou quase nada de um problema cada vez mais crônico - a absoluta, a quase inacreditável falta de profissionalismo na composição do que cada dia se caracteriza mais em mais, como tão somente, armações jornalísticas. Ao que parece, aquele aforismo de Voltaire :"Menti, menti, algo restará" seria ainda aplicável num mundo informatizado e, bem pior, num país em que a cada ataque ao presidente Lula, mais e mais a sua popularidade aumenta.

Franklin Martins, quando ainda não era ministro, disse sobre a revista "Veja" (de quem ele ganhou um processo por injúria e difamação), que a "Veja era a maior inimiga da Veja". Seria de se lembrar a recente capa da revista em que à evidência de que o Itamaraty iria vencer a parada em Honduras, era insistiu em que a condução do "affair" pelo Ministério de Relações Exteriores do Brasil, era um rotundo fracasso? Será que algum jornalista ou editor da revista acha mesmo que sem o apoio expresso dos Estados Unidos, os golpistas de Honduras conseguirão se impor?

Nenhuma destas perguntas são respondíveis. Fica só a evidência de que não apenas a Veja mas os jornais e revistas do País, em sua esmagadora maioria, são mesmo inimigos de si próprios. O fato intriga. Para qualquer sujeito de meia idade que cumpriu boa parte de seus anos de jornalismo nos jornalões e revistonas brasileiras, nunca era evidente, que o que se queria seria, realmente, a verdade. Talvez seja especioso discutir se grande parte da população brasileira era a favor da ditadura militar; no entanto, era razoável que se admitisse o fato. Só que não eram poucos os jornalistas mais velhos, os decanos das redações, que, mesmo não sendo favoráveis à milicada e ao seu regime, insistiam na tese de que o povão bem que o tolerava. Vivia-se o pleno emprego: que diferença fazia que, além dos presos comuns de sempre, jovens militantes e velhos homens de esquerda, estivessem sendo massacrados nos presídios? Para quem trabalhou na mídia da época, era decepcionante, mas era isso mesmo. Não havia como escamotear o fato, a inventar uma revolta que o povo não sentia.

Digamos, então, que a pauta para investigar a grande imprensa hoje deva ser a seguinte: até onde os coleguinhas - fala-se daqueles mais velhos - acreditam no que escrevem? E por que mesmo que a todo o momento exigem a chancela patronal para exporem seus pontos de vista? A isso soma-se um fato ainda mais constrangedor: onde é mesmo que a palavra profissionalismo entra nesta história, se a dimensão da farsa é muito maior que as evidências que inventam o contrário?

São tantos os fatos, que é até fastidioso lembrá-los: não haveria memória para tanto. Pode-se, contudo, tomar qualquer caso ao acaso. Até quando se os rememora, alguns são simplesmente estarrecedores. Na época em que os jornais e revistonas estamparam em letras garrafais a famosa compra do dossiê, em que o hoje governador Serra teria sido investigado, tudo circulou em torno do montante do dinheiro mobilizado. Teoricamente, o pagamento adviria de uma estatal ou de qualquer fonte nunca esclarecida. Até aí, porém, é de se perguntar se essa seria toda a questão.

Pois o inacreditável, em todo o caso, foi o fato certamente inédito na história do jornalismo mundial: eis que a compra do dossiê seria muito mais importante que o dossiê em si. Que jornalismo pode se explicar como tal, ao não se preocupar com as possíveis revelações contidas no tal dossiê, se isso sequer entrou em cogitação? Tudo bem: como disse o presidente Lula -o único que disse alguma coisa, aliás - não havia nada no tal dossiê que realmente pudesse interessar a quem quer que fosse. Mas afora a consideração presidencial, o interesse jornalístico impositivo pelo que o dossiê pudesse conter - esse não foi mencionado ou sugerido uma vez sequer. Era mentira, era irrelevante em princípio, ponto final.

As coisas extrapolam o mínimo. No factóide que foi a denúncia da ex-secretária da Receita Federal que teria se encontrado com com a ministra Dilma Roussef , ocasião em que esta lhe teria pedido "pressa" na apuração de supostos crimes cometidos por José Sarney, a ninguém foi dado saber do princípio jurídico que o "ônus da prova" estaria com a acusadora e não com a acusada. E que quando o Planalto, enfim, encerrou a questão - justamente pela razão que a Justiça lhe dava - não faltaram professores a impingir à ministra a suspeita das irregularidades. Um professor da USP abandonou qualquer bom senso ao insistir, numa entrevista na rádio Cultura, que cabia à Ministra "dirimir as suspeitas".

Pois eram "evidentes", pela prova nenhuma, que a ex-secretária tinha apresentado, que a ministra era suspeita, em princípio. Uma comentarista da CBN, ao admitir que a tal ex-secretária não tinha conseguido convencer ninguém na CPI, nem por isso hesitou um só instante de reiterar, mesmo assim, que a ministra teria "de se explicar". Não é o caso de se exigir um mínimo de proficiência profissional - mas, convenhamos, o despudor tem limites.

Falar em despudor talvez seja de se supor que ele exista. E que a partícula de negação - des - só se aplicasse ao caso, excepcionalmente. Pois haveria ainda que rememorar a interpretação do famoso "top-top" do assessor especial do presidente, o professor Marco Aurélio Garcia, que teria sido flagrado a dirigir os gestos obscenos "às vítimas do avião da TAM" (sic). Nenhum jornalista minimamente probo assacaria que os gestos do assessor da presidência, feito na privacidade de seu gabinete, deveria ser lido como tendo sido endereçado aos passageiros mortos no desastre aéreo. As imagens diziam o que as televisões e as rádios quiseram ver, não o que era mais que evidente: que o sr. Marco Aurélio Garcia xingava justamente as interpretações da grande imprensa; que só faltou dizer que quem tinha derrubado o avião teria sido o presidente Lula. No entanto, propalada a versão mentirosa, tudo ficou ao vento. E aí sim, em conformidade com a máxima voltariana, de que a mentira, repetida muitas vezes, pode alçar vôos mais altos, principalmente para os incautos que gostam de se iludir.

Talvez se possa inferir que tudo da grande imprensa seja mentira -e então nada do que é veiculado pela mídia seria verdadeiro. É um evidente exagero - mas não parece um evidente exagero arriscar que a divulgação do conteúdo da prova do Enem, veio muito bem a calhar. obrigado. Eis que uma empresa jornalística que comanda a gráfica de onde foram surrupiadas as provas, não tem nada a ver com o fato, embora seja, como quase toda a mídia, "de oposição". O que até pode ser verdadeiro, ou seja, que o gráfica não tem nada a ver com o fato. Mas imaginar que alguém possa supor, tranqüilamente, que os autores do crime pensassem em tirar dinheiro do "Estadão"- para o qual foi revelado o conteúdo do Enem- e não de gente que, realmente, pudesse e tivesse interesse em comprá-lo, vai uma distância que só o delegado que presidiu o inquérito não quis ver. Mas que, de qualquer forma, adiou a questão da solução dos vestibulares para um futuro, que talvez contemple o governo Lula com "mais essa": ele não avançou em nada na questão dos vestibulares. E a rapidez com que algumas universidades descartaram se vincularem ao Enem, pode ser lida, sim, como o motivo para não dar ao governo federal qualquer mérito por mexer com o candente problema do vestibular. Ou seja, nada de inquirições para o caso - tão somente a aceitação dos fatos. Não é coisa de profissionais de jornalismo certamente : mas não o será de uma imprensa que a todo o momento se mostra inegavelmente golpista?

Quem tem cerca de 60 anos, já viu esse filme algumas vezes. E como se dizia antigamente, não passa de um tremendo abacaxi.

P.S. Talvez fosse o caso de se ressaltar que a grande imprensa tem o poder de ainda influir sobre a cultura do Brasil. E que os artistas são os primeiros a perderem com isso. Dói, mas é isso mesmo. Daí, entretanto, tantos intelectuais se jogarem à execração do futuro (não é preciso mencioná-los, eles estão nos jornalões a vociferarem contra o governo Lula) só se explica por não acreditarem em si mesmos. O que só confirma Beethoven na sua crítica aos poetas (que vale para todos os que trocam tudo por um espaço na mídia brasileira): eles amam em demasia as lantejoulas da corte para serem levados a sério. A começar pelo futuro.

Enio Squeff é artista plástico e jornalista.

23 de outubro de 2009

PEC da Música

Votação PEC 98/07 - isenta todos os tributos de CDs e DVDs musicais
Music News -

A PEC 98/07, que isenta todos os tributos de CDs e DVDs musicais (produção brasileira) será votada na Câmara dos Deputados.

Com a aprovação da PEC da Música deixam de incidir ICMS, IPI, ISS ou qualquer outro imposto que venha a ser criado e que possa onerar o comércio de música gravada, seja por que meio for.

Quem puder passar e-mails de apoio aos deputados que estarão na votação mais fácil será a aprovação desta emenda constitucional.

Não deixe de comparecer na Câmara dos Deputados (DF) e apoiar esta mudança na lei. A emenda constitucional com certeza irá beneficiar todo o mercado musical brasileiro.

Aqui no estado a deputada Fátima Bezerra-PT faz perte de articulação nacional para a aprovação da PEC.

22 de outubro de 2009

Em Defesa Própria

Rubens Lemos
Em Defesa Própria


A poesia está
no bico do pássaro
(faminto e calmo)
que passa sobre o homem

Apenas o poeta
inconcluso
momento
instrumento

Inacabado artesão
que se permite
vitimar a palavra
com honradez

- A honradez do pássaro
que voa em legítima defesa

16 de outubro de 2009

CULTURA DE MASSA

por Chico Lobo*

Até final do milênio passado, tinha-se muito a criar.

A cultura, a contra-cultura, o modernismo, o pós-moderno, a vanguarda, a ultra-vanguarda. o construtivismo, o descontrutivismo, o punk, pós-punk, metal, gothico, digital, retrô... (imaginem, até retrô por falta do que criar).

As manifestações culturais passaram por todas as fases da criação, e ainda em paises de regime de ditadura, a censura era o combustível da criatividade para aqueles que eram obrigados a se calar, a se imobilizar.

Décadas atraz ainda podíamos dizer que alguém estava além de nossa época, ou no mínimo que criou algo novo no seu conceito arte/cultura. Festivais de música, vernissagens e mostra de arte eram as vitrines e constatações que algo novo surgia a cada momento em nossa civiização.

E o que acontece agora em termos de Cutura de Massa? nos sons, na estética, no comportamento??? - Nada, senão a repetição e a "remixagem" em nova edição dos velhos modelos. Nada de novo no front da cultura.

O que nos resta nessa cultura midiatica digital é ligar o liquidificador "internético" do grande caldeirão do caldo cultural e misturar, mexer, liquidificar, bater, até sair um produto que na verdade é a mistura de tudo o que já foi criado no passado em tendencias e formas e engolir esse amargo saudosismo com sabor de apocalipse. Realmente o mundo acabou no ano 2000, ao menos na criação artístico-cultural.

Chico Lobo - Militante do movimento de rádios livres e fundador da Rádo XXI de São Paulo

13 de outubro de 2009

Entrevista de Maria Bethânia a revista Bravo!

Passa um pouco do meio-dia e, sob orientação do fotógrafo de BRAVO!, Maria Bethânia caminha pelos jardins da Villa Riso, a parte remanescente de uma fazenda do século 18 que se transformou em espaço para festas. É lá, na estrada da Gávea, zona sul do Rio de Janeiro, que a cantora costuma receber jornalistas. O lugar fica próximo à casa onde mora desde 1972. "Por favor", pede-lhe o fotógrafo, "sente-se debaixo daquele pinheiro." Bethânia abana a cabeça negativamente: "Ali não". Com gentileza, mas irredutível, esclarece que pinheiros a incomodam. "Em minha terra, são árvores de cemitério."

Oriunda de Santo Amaro, no Recôncavo Baiano, a irmã de Caetano Veloso - adepto de "uma irreligiosidade feroz", como já se definiu - nunca separou rigidamente o místico daquilo que os cartesianos chamam de real. Para a intérprete, o sagrado e o corriqueiro se entrelaçam. Um explica e alicerça o outro. Tal convicção, que a artista manifesta com uma naturalidade às vezes desconcertante, estimula um divertido folclore em torno dela, uma profusão de lendas que a tomam por feiticeira ou algo assim. "Quando Bethânia inicia uma turnê, chove. Evite usar negro ao lado de Bethânia. Sempre que Bethânia entra no estúdio, os monitores de ouvido acusam interferências." Das inúmeras histórias, a cantora - famosa por resguardar avidamente a própria intimidade - só confirma que não veste roupas pretas. Dispensa a cor em respeito às recomendações do candomblé, crença que abraçou junto com a devoção pelo catolicismo. "Mas podem usar negro perto de mim", avisa, às gargalhadas.

A faceta mística de Bethânia desponta claramente no CD Encanteria, um dos dois que acaba de lançar. O álbum do selo Quitanda agrega 11 composições inéditas - sambas e toadas sobre orixás, santos e as celebrações que os homenageiam. Caetano e Gilberto Gil cantam na faixa Saudade Dela. O outro disco, Tua, sai pela Biscoito Fino. Também reúne 11 músicas inéditas e conta com a participação do pernambucano Lenine. De sonoridade mais urbana, tem como mote o amor.

Em conjunto, os delicados trabalhos reafirmam que Bethânia já não cabe apenas nos rótulos de "romântica", "brejeira" ou "artista de massa". Ela é hoje, aos 63 anos e 46 de carreira, um clássico à altura de Edith Piaf, Nina Simone ou Ella Fitzgerald, ainda que de abrangência menor.

Durante a entrevista de quase duas horas, a cantora trajava uma pantalona azul e uma pashmina cor-de-rosa, espécie de xale que lhe recobria os ombros. Pelas mãos, braços e pescoço, espalhava algumas joias, a maioria dourada. Um dos anéis e o relógio de pulso despertavam especialmente a atenção.

BRAVO!: Que anel curioso…

Maria Bethânia: Você gostou? Traz a imagem do meu caboclo.

Um índio?

Exato, o caboclo que me protege, graças a Deus. Veja só que história inusitada: uma vez, desembarcando em Miami, topei na imigração com um policial branco, alto e muito forte. "Virgem Santíssima!", pensei. "Olhe o tamanho do sujeito!" No entanto, para minha surpresa, o homem sorriu. Quando pegou meu passaporte, notei que ostentava um anel de prata enorme. Uma peça luminosa, com o rosto de um índio. "Que anel incrível!", comentei em português. O homem continuou rindo como se me compreendesse. De repente, tirou o anel e me deu. Um gesto absolutamente improvável: a polícia dos Estados Unidos distribuindo presentes no aeroporto?! Tão logo retornei para casa, providenciei uma cópia do anel, menorzinha, em ouro. É a que estou usando.

Qual o nome do caboclo? Pode revelar?

Quer saber demais sobre o meu caboclo! (risos) Há décadas, pertenço à Nação Ketu do candomblé. Mas, ainda garota, em Santo Amaro, costumava visitar um terreiro de outra nação, a Angola. Ali os fiéis não cultuavam somente os orixás. Também recebiam o espírito dos índios que habitaram o Brasil, os caboclos. É uma tradição maravilhosa, que me comove. Por isso, conservo o anel. Sem contar que tenho uma bisavó indígena, da etnia pataxó.

E o relógio?

Comprei para marcar um acontecimento...

Que acontecimento?

Não vou entrar em detalhes. Foi algo bonito que me ocorreu e que se relacionava com o tempo. Precisava de uma coisa que simbolizasse aquilo.

Como uma tatuagem?

Tatuagem, não — o candomblé proíbe. Engraçado que, bem jovenzinha, sonhava em fazer uma. Cresci num lugarejo repleto de rios, mas passava as férias na praia. Sempre amei perdidamente o mar. Meu pai dizia que a terra e o oceano se espelham. "Tudo o que existe aqui em cima existe no fundo do mar." Eu o escutava, e minha imaginação corria solta: "Tudo, pai? Coqueiro, abelhas, montanha?". Ele jurava que sim. Não à toa, os marinheiros me encantavam. Admirava as tatuagens que carregavam nos braços. "Quando mandar em mim, arranjarei uma igual", planejava. Àquela época, poucas mulheres ousavam exibir tatuagem. Eu, atrevida, desejava uma nas costas, do lado direito, perto da bunda. Cogitei, primeiro, desenhar uma sereia. Sou fascinada por sereias. Depois mudei de opinião: "Vou botar uma estrela, ou um sol, ou uma lua". Acabei não desenhando nada.

Sereias a fascinam?

Imensamente. Criança, ganhava umas de minha mãe, pequeninas, de barro. Agora ganho dos amigos e dos fãs. Em casa, há um punhado: de metal, gesso, madeira. Sereias são as donas da voz... Senhoras da emissão, que cantam por minha boca. Só sei cantar graças às sereias. Elas me ensinaram. Minha voz apenas mora em mim. Não é minha. É das sereias. É de Deus.

Uma metáfora, não? Ou você realmente acredita que sereias existam?

Acredito. Certas pessoas conseguem ouvi-las, enxergá-las. Eu nunca as enxerguei. Mas as sinto, talvez porque queira senti-las. Creio que hoje esteja no mesmo lugar em que as sereias se encontram. Uma bênção!

Julga-se predestinada?

Sem dúvida. Nasci para o que faço. Já na infância, me comportava de maneira incomum. Andava maquiada por Santo Amaro como uma vedete, confeccionava minhas próprias roupas e imitava os personagens das peças que o grupo local de teatro montava. O povo da cidade morria de vergonha. Evitavam a minha companhia. Somente o Caetano me apoiava. Eu avisava: "Não adianta reclamar, pessoal! Sou do palco, vou viver do palco". Não suspeitava ainda que iria cantar. Pretendia virar trapezista. Circo me atraía muitíssimo. Uma ocasião, caí de amores por um palhaço, o Poli, mal o avistei no picadeiro. Paixão doida, de cinema! Fiquei tão envolvida que arrumei um jeito de conhecê-lo sem máscara. Era um homenzinho calvo, quase sexagenário. "Vou fugir com o senhor!", repetia. O coitado, lógico, apenas gargalhava. Quando o circo partiu de Santo Amaro, me desmanchei de tanto chorar.

Em que momento você resolveu se tornar cantora?

Com uns 15 anos. Ou melhor: Caetano resolveu por mim! (risos) Ele compunha a trilha de um curta [Moleques de Rua, do diretor Álvaro Guimarães, o Alvinho] e me pediu para gravá-la. Topei na hora. Quatro anos mais velho, Caetano me influenciava bastante. Nós o considerávamos o gênio da família. Desde cedo, o danado pintava como ninguém, tocava, escrevia canções. Lembro-me de vê-lo redigir uma peça inteira com 8 ou 9 anos. "Você vai fazer o papel da estrela", me prometia. Eu, um toquinho de gente, concordava. (risos) O negócio é que acabei gravando a trilha em Salvador, no ateliê de Mário Cravo Jr. [escultor]. Que período bom, rapaz! Pouco depois, em 1963, Alvinho encenou Boca de Ouro, a tragédia do Nelson Rodrigues, e me chamou para cantar um samba de Ataulfo Alves no prólogo. Iria interpretá-lo da coxia, sem aparecer. Mesmo assim, não deixei de caprichar nos trajes. Pus luvas, brincos, colar...

Foi em Salvador, na década de 1960, que você se aproximou de Gal Costa. Continuam amigas?

Continuamos, só que não como antigamente. Perdemos o convívio. Éramos grudadas, irmãs. Agora... Gal se distanciou muito de mim e de Caetano. Não brigamos nem nada. Ela apenas se isolou. Diminuiu o ritmo, se afastou da música, adotou um filho [Gabriel, em 2007]. Mora lá na Bahia e cuida do menino, linda. Um dia lhe perguntei: "Do que você mais gosta hoje, do canto ou da maternidade? Me responda, mulher!". Não respondeu. (risos) Tenho a impressão de que Gal, uma cantora inigualável, não se entusiasma tanto pelos novos autores. Deve avaliar que suas composições não estão à altura da voz dela, daquele cristal perfeito. É compreensível. A emissão de Gal exige de fato canções tão sofisticadas quanto as de Caetano, Chico Buarque, Dorival Caymmi, Tom Jobim, Ary Barroso. Eu, em contrapartida, não enfrento o mesmo problema. Sou uma intérprete antes de tudo. Uma intérprete de textos, de ideias, que também pode cantar. Não sou uma purista.

Você nunca pensou em gerar ou adotar um filho?

Pensei em dar à luz com meus 18, 19 anos. Desisti mais tarde e não me arrependo. Filho são meus discos, é minha carreira. Não disponho da sabedoria de meus pais para educar uma criança. E o mundo em que vivemos... A correria, a violência, a competição, o ar irrespirável... Colocar um bebê nesse inferno? Em um planeta sufocado? Fico apavorada quando constato algumas inversões de valores. O dinheiro, por exemplo. Virou o centro do universo. Uma loucura! Às vezes, acho que a atual crise financeira é um alerta do próprio dinheiro: "Prestem atenção! Entendam a minha natureza. Posso dormir um hoje e acordar outro amanhã". Enfim... Sou cruel com os amigos e sobrinhos que têm filhos. Cobro que zelem pelas crias e não admito que se queixem. Decidiram ter? Então se redobrem para ampará-los.

Os dilemas ecológicos parecem preocupá-la. Você apoiará a possível candidatura à presidência da senadora Marina Silva, que acabou de ingressar no Partido Verde?

Marina me arrebata. É nobre, firme, sóbria. E domina a área dela, a do meio ambiente. Como Gilberto Gil [ex-ministro da Cultura], passou pelo governo federal sem se manchar, sem cometer erros crassos. Jurei que não votaria mais em candidato nenhum, nem do Executivo nem do Legislativo. Mas a Marina talvez me anime a voltar atrás. Fechei com Lula nas eleições de 2002 e, depois, parei de votar. Os políticos me irritam. Imaginam que somos idiotas.

Recentemente, você sofreu críticas da imprensa por recorrer à Lei Rouanet para bancar alguns de seus espetáculos...

(Interrompendo) Sofri... Uma palhaçada! Uma tristeza! "Governo de esquerda só pode ajudar quem não faz sucesso." Que raciocínio torto! A lei deve acolher gregos e troianos: o ministério avaliza os projetos e cada artista sai à caça de patrocinador, como manda o figurino. Qual o drama? Por que tanta chateação?

Porque se trata de verba pública.

Verba pública? Nunca trabalhei com verba pública!

A lei prevê que os patrocinadores descontem os gastos do Imposto de Renda - um dinheiro que, em tese, iria para o setor público.

Renúncia fiscal, menino! É um mecanismo ótimo! O mínimo que a cultura merece.

E quanto à alegação de que shows como os seus ou os de Caetano, Ivete Sangalo e outros cantores famosos se pagariam apenas com a bilheteria, sem a necessidade de patrocínio?
O quê? Apenas com a bilheteria? Qualquer espetáculo de certo porte no Brasil consome uma fortuna. Nossos custos são de ópera! A plateia pede um cenário elegante, uma iluminação de primeira, um som magnífico. Não condeno, não. Estão corretíssimos! Mas qualidade tem preço. Para subir num palco, preciso ensaiar 40 dias ou mais. Você sabe o que significa arcar com 40 dias de estúdio, técnicos, equipamento, músicos? Um absurdo! "Ah, a cantora também leva uma bolada." Leva? Quem menos ganha é a cantora. Com despesas tão elevadas, você julga
viável depender só da bilheteria? Não há Canecão lotado que cubra um espetáculo. Não há teatro
no país que cubra - e olhe que os ingressos não são baratos, infelizmente. Sem patrocínio, amargaríamos prejuízo caso quiséssemos manter o alto nível dos shows. E, sem a lei, não conseguiríamos patrocínio nenhum. Zero! Portanto...

6 de outubro de 2009

4ª Mostra Cinema e Direitos Humanos na América do Sul

A 4ª Mostra Cinema e Direitos Humanos na América do Sul será exibida de 7 a 11 de outubro a partir das 13 horas no Sebrae-RN. A entrada é gratuida. Serão exibidos 41 filmes, entre eles, Garapa, Corumbiara, À Margem do Lixo e Pro Dia Nascer Feliz.

07/10 - quarta

13h
MOKOI TEKOA PETEI JEGUATÁ – DUAS ALDEIAS, UMA CAMINHADA - Arial Duarte Ortega, Germano Beñites, Jorge Morinico (Brasil, 63 min, 2008, doc)
DE VOLTA À TERRA BOA - Mari Corrêa, Vincent Carelli (Brasil, 21 min, 2008, doc)
PRÎARA JÕ, DEPOIS DO OVO, A GUERRA - Komoi Paraná (Brasil, 15 min, 2008, doc)
Classificação indicativa: livre

15h
NUNCA MAIS!!! COCHABAMBA, 11 DE JANEIRO DE 2007 - Roberto Alem (Bolívia, 52 min, 2007, doc)
DAYUMA NUNCA MAIS - Roberto Aguirre Andrade (Equador, 30 min, 2008, doc)
Classificação indicativa: livre

17h
À MARGEM DO LIXO - Evaldo Mocarzel (Brasil, 84 min, 2008, doc)
Classificação indicativa: livre

19h
SENTIDOS À FLOR DA PELE - Evaldo Mocarzel (Brasil, 80 min, 2008, doc)
PUGILE - Danilo Solferini (Brasil, 21 min, 2007, fic)
Classificação indicativa: livre

21h - Sessão de abertura
CORUMBIARA - Vincent Carelli (Brasil, 117 min, 2009, doc)
Classificação indicativa: livre


08/10 - quinta

13h
PRO DIA NASCER FELIZ - João Jardim (Brasil, 88 min, 2006, doc)
Classificação indicativa: livre

15h – Audiodescrição
O SIGNO DA CIDADE - Carlos Alberto Riccelli (Brasil, 96 min, 2007, fic)
* Sessão com audiodescrição para público com deficiência visual
Classificação indicativa: 16 anos

17h
CRUELDADE MORTAL - Luiz Paulino dos Santos (Brasil, 92 min, 1976, fic)
ESTRELA DE OITO PONTAS - Fernando Diniz e Marcos Magalhães (Brasil, 12 min, 1996, fic/ani)
Classificação indicativa: 16 anos

19h
UNIDADE 25 - Alejo Hojiman (Argentina / Espanha, 90 min, 2008, doc)
COCAIS, A CIDADE REINVENTADA - Inês Cardoso (Brasil, 15 min, 2008, doc)
Classificação indicativa: 16 anos

21h – Audiodescrição
NÃO CONTE A NINGUÉM - Francisco J. Lombardi (Peru / Espanha, 120 min, 1998, fic)
* Sessão com audiodescrição para público com deficiência visual
Classificação indicativa: 18 anos


09/10 - sexta

13h
YÃKWÁ, O BANQUETE DOS ESPÍRITOS - Virgínia Valadão (Brasil, 54 min, 1995, doc)
A ARCA DOS ZO’É - Dominique Tilkin Gallois, Vincent Carelli (Brasil, 22 min, 1993, doc)
O ESPÍRITO DA TV - Vincent Carelli (Brasil, 18 min, 1990, doc)
Classificação indicativa: livre

15h
TAMBÉM SOMOS IRMÃOS - José Carlos Burle (Brasil, 85 min, 1949, fic)
Classificação indicativa: livre

17h
O REALISMO SOCIALISTA - Raúl Ruiz (Chile, 52 min, 1973, fic/doc)
AGARRANDO PUEBLO (OS VAMPIROS DA MISÉRIA) - Carlos Mayolo, Luis Ospina (Colômbia, 28 min, 1978, fic)
Classificação indicativa: 16 anos

19h
DEVOÇÃO - Sergio Sanz (Brasil, 85 min, 2008, doc)
PHEDRA - Claudia Priscilla (Brasil, 13 min, 2008, doc)
Classificação indicativa: 12 anos

21h
GARAPA - José Padilha (Brasil, 110 min, 2008, doc)
Classificação indicativa: 12 anos


10/10 - sábado

13h
TAMBORES DE ÁGUA: UM ENCONTRO ANCESTRAL - Clarissa Duque (Venezuela / Camarões, 75 min, 2008, doc)
ALÉM DE CAFÉ, PETRÓLEO E DIAMANTES - Marcelo Trotta (Brasil, 15 min, 2007, doc)
TARABATARA - Julia Zakia (Brasil, 23 min, 2007, doc)
Classificação indicativa: livre

17h
HISTÓRIAS DE DIREITOS HUMANOS – vários diretores (diversos países, 84 min, 2008, doc/fic)
Classificação indicativa: 16 anos

19h
BAGATELA – A NECESSIDADE TEM CARA DE CACHORRO - Jorge Caballero (Colômbia / Espanha, 74 min, 2008, doc)
MENINO ARANHA - Mariana Lacerda (Brasil, 13 min, 2008, doc)
MENINOS - Gonzalo Rodríguez Fábregas (Uruguai, 14 min, 2008, doc)
Classificação indicativa: 12 anos

21h
ENTRE A LUZ E A SOMBRA - Luciana Burlamaqui (Brasil, 150 min, 2007, doc)
Classificação indicativa: 16 anos


11/10 - domingo

13h
O SIGNO DA CIDADE - Carlos Alberto Riccelli (Brasil, 96 min, 2007, fic)
OS SAPATOS DE ARISTEU - René Guerra (Brasil, 17 min, 2008, fic)
Classificação indicativa: 16 anos

15h
TRAGO COMIGO – Parte 1 (capítulos 1 e 2) - Tata Amaral (Brasil, 96 min, 2009, doc/fic)
Classificação indicativa: 16 anos

17h
TRAGO COMIGO – Parte 2 (capítulos 3 e 4) - Tata Amaral (Brasil, 96 min, 2009, doc/fic)
Classificação indicativa: 16 anos

19h
ESSE HOMEM VAI MORRER - UM FAROESTE CABOCLO - Emilio Gallo (Brasil, 75 min, 2008, doc)
CONTRA-CORRENTE - Agostina Guala (Argentina, 9 min, 2008, fic)
PARTIDA - Marcelo Martinessi (Paraguai, 14 min, 2008, fic)
Classificação indicativa: 16 anos

21h
O CAVALEIRO NEGRO - Ulf Hultberg, Åsa Faringer (Suécia / México / Dinamarca, 95min, 2007, fic) Classificação indicativa: 14 anos


* O formato de exibição dos filmes é DVCAM.

Do Circo

DE WODEN MADRUGA, EM SUA COLUNA NA TRIBUNA DO NORTE:

Do Circo

Quando a notícia do fechamento do circo Grock – por determinação da Prefeitura – riscou na calçada do Café Cova da Onça, mestre Gaspar não chegou a contar nem três. Disse em cima da bucha:

- A prefeita não admite concorrências.

4 de outubro de 2009

Carta aberta do Circo Grock

Carta aberta do Circo Grock

Natal, 2 de outubro de 2009

Caros amigos, parceiros, moradores de toda Natal, artistas, jornalistas e a todos que se mobilizaram para defender a cultura potiguar, o universo circense, ou seja, o Circo Grock, que foi acometido pelo incidente ocorrido ontem (1º).

Nós, a Escola Potiguar das Artes do Circo, que compomos o Circo Grock, queremos agradecer o empenho, o carinho, engajamento de todos acima citados no fato ocorrido ontem. Muito obrigado é pouco para todos vocês.

Mas, como o nosso amigo Deputado Mineiro desejou que na reunião que houve hoje (2) às 10 horas da manhã na sede da SEMSUR com o Secretário o Sr. Bastos e outros representantes da Prefeitura de Natal, prevaleceu o bom senso.

Tanto foi esclarecido para a Prefeitura do Natal, não que eles não soubessem de nossa forma de trabalhar, mas sim, fatos destorcidos levados por pessoas que não quiseram e não querem conhecer nossos projetos, por motivos que não compete a nós, enquanto Educadores, discutir aqui. Na verdade queremos mesmo é agradecer, pois como diz o dito popular “nada acontece por acaso” e esse incidente só trouxe grandes mudanças para o Circo.

Mas antes disso queremos esclarecer a todos que o Circo Grock nunca quis permanecer para sempre, e nem muito menos iria se utilizar do usucapião para se apropriar do terreno público. Nossa estadia neste bairro foi e é para que nós pudéssemos nos legalizar como casa de espetáculo e enquanto estávamos pleiteando junto a órgão públicos um local de fácil acesso para instalação da Escola de Circo (que já é legalizada).

Esta é a semente que queremos deixar plantada aqui no Rio Grande do Norte, pois queremos que o Circo Grock seja itinerante pelo Brasil e exterior, em outras palavras queremos mostrar para o mundo a cultura circense potiguar, porque somos potiguares e amamos nossa terra e o ocorrido de ontem só fez acelerar os trâmites.

Para não entrar em mais detalhes que só poderemos comunicar após outra reunião já marcada para a próxima semana, quero finalizar que a Prefeita Micarla de Sousa, que conhece e gosta do nosso trabalho, declarou por telefone para Nil Moura que é de interesse da prefeitura apoiar a Escola Potiguar das Artes do Circo e o Circo Grock, então me antecipo declarando que o Circo é de todos e que o Espetáculo não vai parar.

“E Viva o espetáculo da Vida”, viva o espetáculo da Educação e da Comunicação!

A Equipe do Circo Grock